Nacionalismo às avessas

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Ao preencher um formulário (do mesmo modelo daqueles que servem para requerer Carteira de Identidade, CPF, Passaporte, etc.) tive um dilema moral ao ter que preencher a lacuna Nacionalidade. Bom, no meu RG está escrito que sou brasileira, no meu passaporte também, mas, afinal, ser brasileiro é ter pura e simplesmente nascido no Brasil?
O que é ser brasileiro?
Antes do advento do colonialismo, não havia brasileiros neste território em que vivemos porque o lugar denominado Brasil ainda não existia. Porém, com a vinda dos portugueses ao Brasil, os filhos destes nasciam aqui, e passavam a ser chamados de brasileiros. Sim, alguns entes da nobreza da época eram brasileiros ao mesmo tempo que alguns escravos indígenas eram brasileiros, ou seja, todos que nasciam aqui eram considerados brasileiros. Incrível, não é!? Então, um brasileiro tinha a coragem de escravizar, massacrar outro brasileiro. Um descendente português não tinha o mínimo pudor para matar um nativo.... Portanto, o nacionalismo aqui não era algo digno de orgulho... Não havia uma identidade nacional já que brasileiros podiam ser pessoas tão diferentes. Se os portugueses admitissem que índios, camponeses, nobres e burgueses eram todos brasileiros, teriam que dar direitos iguais a todos eles. Seria o fim da escravidão, da exploração, para a tristeza da Corôa .
Agora, também tenho minhas dúvidas quanto a outra idéia: se boa parte de nossa cultura só existe graças à colonização portuguesa, poderíamos dizer que somos culturalmente portugueses? Será que se eu fosse considerar os colonizadores de meu país, poderia considerar a minha identidade portuguesa?
Portanto, defini minha nacionalidade de dois modos distintos:
A partir de meu local de nascimento
A partir de minha origem cultural
Então, como defino minha nacionalidade? Será que ela é única?
Hoje, quando ocorre um jogo futebolístico (saudações ao Nilton Saldanha!) como a final da Libertadores entre Fluminense e LDU, os brasileiros (digo aqui de todos os times: Botafogo, Flamengo, Vasco da Gama, etc...) unem-se para torcer para o Fluminense... Aí, eu pergunto: Por que? "Ah, porque temos que torcer pelo Brasil!!!!"
Então, é explicito, todos querem mostrar... eu sou brasileiro!!!!
Fim de jogo, vitória da LDU.... Poxa, ainda bem que eu não sou Fluminense...
Ué! Mas você não estava torcendo pelo “Brasil”? Então você perdeu, camarada!
Agora, não é mais brasileiro?
É aí que está o grande X da questão:
Somos brasileiros por conveniência.
- Brasil: pentacampeão em Copas do Mundo – Sou brasileiro!
- Brasil: país subdesenvolvido – Não sou brasileiro!
- Brasil: melhor seleção de Volleyball no Mundo – Sou brasileiro!
- Brasil: país de terceiro mundo – Não sou brasileiro!
- Brasil: um país de analfabetos – Não sou brasileiro!
- Brasil: um país de criminalidade – Não sou brasileiro!
- Brasil: um país de corrupção – Não sou brasileiro!
Aí vem o desespero pois temos muito mais motivos para não sermos brasileiros do que para nos orgulharmos de nosso país.... Portanto ao assinalar a nacionalidade brasileira em um documento podemos entrar em conflito com nossa própria ideologia. Se eu não me considero brasileiro, porque tenho que escrever que o sou? Ser brasileiro é muito mais do que nascer nessas fronteiras, é se orgulhar dos prós e contras, das belezas e contradições de nosso país. Mas, principalmente, é saber valorizar o que as outras nações nos trazem sem perder nosso caráter nacional. Isso nos leva a seguinte manifestação...
Gostaria de manifestar a minha reprovação em relação à uma idéia defendida por inúmeros nacionalistas de plantão: ser brasileiro é viver nacionalmente, ou seja, não sucumbir às tendências globais.
É impossível, a mídia não deixa isso acontecer, e não é necessário valorizar somente sua própria nação. Podemos conhecer culturas alheias à nossa, aproveitando inúmeros elementos, mas obviamente valorizando também elementos de nossa própria cultura. Desenvolver um nacionalismo xenófobo não é saudável pois pode induzir a uma alienação já que a globalização faz parte de nossas vidas.
Tudo tem seus prós e contras, assim como o Brasil. Portanto, devemos orgulharmo-nos de nosso país mesmo que além dos prós ele apresente, pelo perdão da palavra chula, muito “podres”.
Porém, o meu foco aqui é o nacionalismo...
Percebo então que não é possível definir o pais em que vivo pois é apenas uma nomenclatura relacionada ao território em que nasci. Portanto, culturalmente, se me perguntarem minha nacionalidade direi sem exitar “Sou uma cidadã do Mundo...”pois nasci em meio às mais variadas culturas....
E você? Qual é a sua nacionalidade?
“Brava gente brasileira, Longe vá temor servil; Ou ficar a pátria livre, Ou morrer pelo Brasil” – Trecho do Hino da Independência do Brasil (Evaristo da Veiga)
“Cabra gente brasileira, Descendente de macaco, Que trocou a Cruz de Cristo pelos ramos de tabaco.” – Paródia feita pelos portugueses sobre a identidade dos brasileiros na época colonial. Só eles não vêm que os filhos deles que nascem no Brasil são brasileiros. Portanto, quem eles acham que estão criticando?
Um abraço!
Mahatma Naiads

4 Responses to "Nacionalismo às avessas"

Dias Says :
14 de julho de 2008 às 14:42

Quando amamos alguém, não nos importamos com os defeitos. Amamos os defeitos e as qualidades. Amamos por completo.
A pátria não é diferente. Por mais que esse seja um país sujo, feio e porco, eu o amo. Não porque nasci aqui somente. Mas porque em algum momento do meu crescimento decidi que eu queria o melhor para a minha pátria. Seria mais fácil ir para um canto da Europa super desenvolvido e sem problemas.
Mas o Brasil é a minha terra e o meu povo. É essa a pátria que me criou e ela eu amo.

g.winme Says :
15 de julho de 2008 às 13:19

Concordo com o comentário acima.

Mas concordo e discordo com uma parte do texto.
O problema não é aceitarmos a cultura alheia, e sim aceitarmos a cultura alheia antes negando nossa própria cultura! Como podemos aceitar o que vem de fora se não aceitamos o que vem de dentro?
Tudo bem, a verdade é que podemos sim aceitar algumas coisas de fora, mas antes devemos aceitar e viver o de dentro, a cultura da NOSSA pátria.

inferninho Says :
15 de julho de 2008 às 16:07

Algumas pessoas me chamam de moralista quando fico falando por aê que é ao Brasil que a gente deve agradecer por estar vivo..
Ou tão igualmente agradecer à nossa sorte pois o Brasil atual também é motivo de morte.
Bem, sem muitos comentários.
O texto tá ótimo!
Adorei.. só não estou mt inspirada no momento p/ fazer um comentário decente, como já disse!
Beijos

L. Hobbit Says :
16 de julho de 2008 às 15:58

Cara seu texto fala tudo.
Nunca pensei a respeito do que você fala no inicio (sobre a época da colonização e tal).

Tenho orgulho de ser brasileira porque foi aqui que nasci é aqui que eu vivo e é aqui que ta minha gente. Eu amo meu país apesar dele sempre me dar motivos do contrario.
(como diz o livre pub).

Realmente se intitular brasileira é difícil afinal nosso povo e nossa cultura são formados por junções de vários tipos que até conflitam entre si. E antes da junção? Não havia nada "o ser brasileiro" não existia.

Concordo com G., devemos nos aceitar apesar de nossos defeitos.
E nos aceitando é que podemos mudar as coisas que estão erradas, porque só queremos mudar, só queremos o bem, daquilo que amamos.

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